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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Trabalho árduo de restauração

22/3/2020 - Osasco - SP

E que coisa seremos nós? Vozes escorregadias de chegadas duvidosas, com pretensões injustificáveis de caráter lapidado apenas para ser amostra? 

Que algo será esse nós? Existências colocadas em ação, prontas a testar os absurdos da realidade, e incapazes de olhar para as estrelas quando a noite se aproxima? Agora, cerrados em casa se assim o privilégio atender, talvez discursos ainda mais entristecidos, emoldurados em paredes suportadas por pisos frios, a reclamar a audácia de a oportunidade desse tempo doer.

Para mim, essas caricaturas de sociedade reiteram o excesso de verdades que nos puseram para crer. A era das tecnologias, de transmissão de doenças e apatias, manifestando a hipocrisia de, pelo caminho usurpado do outro, poder vencer.

Ouço discursos indigestos enquanto faço minha refeição. Minhas leituras reverberam um mundo incrédulo, de onde saem páginas de sangue pelo uso irrestrito do que costumam chamar de “vocação”.

As falas abençoadas colocam poder nas palavras ao mesmo tempo em que esvaziam o objetivo de transformação. Segmentos corrompidos de um vírus que, apesar de tudo, é legítimo, e que parece ter sido o último grito de um planeta que clama por uma nova e completa seleção. 

Os fundamentalistas teimam por seus motivos últimos e ancestrais, vocalizando, aos berros, a insistência pelo que não deu certo, ao mesmo tempo em que a Terra grita: não dá mais. 

Nossos rios, já engasgados, acusam o poder cruel e salafrário das imundices que materializamos. Do quarto, pareço ouvir dos pássaros: sigam aí dentro, pois aqui fora estamos num trabalho árduo de restauração.

 

THIANE ÁVILA.

 

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